Viver é fazer história. Somos agentes, protagonistas e testemunhas da grande mudança da história humana que vem migrando da era da Terceira Revolução Industrial para a Revolução Digital em direção à Quarta Revolução Industrial.
Vivemos em um tempo revolucionário. Uma era de ruptura, transformacional.
Esta era se caracteriza pelo conhecimento e pela tecnologia. Seu eixo tecnológico é o processador eletrônico de dados, o coração da era digital e o motor da era disruptiva. E toda a organização da atividade humana vem sendo impactada pela Inteligência Artificial, uma nova superesfera, criada graças às novas tecnologias e, claro, aos processadores. Todas as tarefas realizadas pelo homem, do uso da força bruta a complexos cálculos eletrônicos, da armazenagem de dados na nuvem a procedimentos médicos com robôs cirúrgicos, de comunicação instantânea em nível global a decisões na gestão da administração pública, pode ser facilitada com o uso adequado de softwares e hardwares, de aplicativos e dispositivos.
A era digital está ainda em seu início. E aponta para possibilidades infinitas.
O mundo que está surgindo será inteiramente diferente deste em que vivemos. O desafio, para o Brasil, é não deixar escapar a oportunidade que temos de sair na frente. Neste sentido, a crise é uma benção. Eis porque precisamos nos mobilizar, fazermos o debate online, criarmos o grande projeto do Brasil Digital e envolvermos a nação, lembrando de Geraldo Vandré: Quem sabe faz a hora, não espera acontecer.
Vamos imaginar que façamos a transição da era analógica para a era digital. Suponhamos, ainda, que esta nova era nos propicie um elevado grau de competitividade no mundo moderno e que esta posição de destaque nos traga progresso e prosperidade como nunca tivemos antes.
Ainda assim, se não tomarmos cuidado, corremos o risco de recair nos vícios da demagogia e das promessas do paraíso grátis.
E o caminho para garantirmos a prosperidade de modo sustentável está em cultivarmos uma cultura que valorize e proteja os valores condicionantes do progresso. Precisaremos “blindar” nossa prosperidade com uma sólida cultura liberal.
A cultura, na definição do antropólogo Edward B. Tylor, é “todo aquele complexo que inclui o conhecimento, as crenças, a arte, a moral, a lei, os costumes e todos os outros hábitos e capacidades adquiridos pelo homem como membro da sociedade”[i].
A “cultura social”, em complemento, pode ser definida como o conjunto de ideias, comportamentos, símbolos e práticas sociais valorizadas pelos membros da sociedade. Vem a ser o conjunto de “valores”, as crenças fundamentais, que norteiam o comportamento.
Dentro do contexto da filosofia, a cultura está a serviço das necessidades, aspirações e desejos humanos. A cultura, vista pela ótica da civilização, reúne a maneira como o homem foi resolvendo seus problemas ao longo da história. Cultura, assim, algo que o homem criou ao longo de gerações. Como somos “animais sociais” – e nenhum homem é uma ilha – o “Homo-sapiens” só se torna homem porque vive em meio a um grupo cultural. Dentro deste grupo cultural predominam as ideias, comportamentos, símbolos e práticas sociais que estabelecem o que é aceitável e o que não é. Ou seja, o que é bom e o que não é, que estabelece a noção do bem e do mal para aquele grupo social.
A “cultura social” é, em consequência, um sistema de símbolos compartilhados com que se interpreta a realidade e que confere sentido à vida de seus membros. Representa, portanto, uma força poderosa que permeia todo o tecido social. Dela deriva uma matriz de estímulos e condicionamentos que influenciam o comportamento dos membros do grupo e os recompensam na medida que adotam os comportamentos alinhados com os valores do grupo.
Reconhecendo a força da “cultura social” como indutora de comportamentos e, em consequência, como âncora da prosperidade, Tharman Shanmugaratnam, Vice-Primeiro Ministro e Ministro da Fazenda de Singapura, explica sua importância comparando seus efeitos sobre o comportamento da sociedade com a “Mão Invisível do Mercado” de Adam Smith e a define como a “Mão Invisível da Cultura Social”.
“Mão invisível” foi, como se sabe, uma expressão introduzida por Adam Smith em “A Riqueza das Nações”, para descrever o processo virtuoso que ocorre em uma economia de mercado, onde, apesar de não ser visível uma coordenação dos interesses individuais, estes tendem convergir de modo a produzir o “bem comum”. É como se houvesse uma “mão invisível” dirigindo a tomada de decisões dos investimentos e negócios. A “mão invisível”, a que o filósofo iluminista se refere, explicava algo similar ao que hoje chamamos de lei da “oferta e procura”.
O Ministro Tharman, ao reconhecer a força da “Mão Invisível da Cultura Social” no comportamento das sociedades, afirma que a construção de “uma boa sociedade” se firma sobre um conjunto salutar de bons valores e condutas, especialmente quando a sociedade valoriza o desejo das pessoas de tomar responsabilidade sobre si mesmas e suas famílias, bem como contribuir para o êxito dos demais.
Para o Ministro Tharman, uma vez que se entenda e aceite o conceito da “Mão Invisível da Cultura Social” se pode usá-lo de forma a estimular os valores que vão moldar uma cultura social propícia à prosperidade. Em uma relação de causa e efeito, quando a Cultura Social muda, muda o comportamento da sociedade. A boa nova, segundo Tharman, é que a cultura social não é imutável. Ela muda em resposta às políticas adotadas.
O Ministro Tharman usa a expressão “Compacto Social” para definir o “acordo” que deve ser estabelecido entre os membros de uma sociedade organizada, ou entre os governados e o governo comprometido com a prosperidade, definindo e limitando os direitos e deveres de cada um.
Ele exemplifica mostrando que as pessoas tendem a agir segundo regras do contexto politico, social e econômico em que vivem. E o sucesso destas sociedades é ditado pela maior ou menor excelência das regras e conceitos adotados neste “Compacto Social”.
Quando o “Compacto” reúne políticas saudáveis e conta com a adesão da sociedade, a “Mão Invisível” se encarrega de promover o desenvolvimento e distribuir prosperidade entre os membros da sociedade. É pelo resultado obtido que se pode avaliar a qualidade dos “Compactos”, ou “combos de valores”. Tharmam sugere a comparação do resultado em sistemas como o comunismo, a social democracia ou capitalismo de livre-mercado.
Para Tharman. políticas redistributivas no contexto do “Compacto” podem apenas obter sucesso se forem desenhadas para encorajar uma cultura de responsabilidade pessoal e se promoverem a responsabilidade coletiva entre todos.
Ainda na opinião do Vice-Primeiro Ministro, a quatro áreas que concernem à Cultura Social e devem estar no eixo das politicas do governo são: 1) A mobilidade social sustentada; 2) Acordo claro entre a responsabilidade individual e a responsabilidade coletiva; 3) Cultivar uma cultura de inovação e de aceitar riscos; 4) Crescimento do bem publico e o papel dos espaços públicos e da sociedade civil.
A autoridade do Ministro Tharman Shanmugaratnam vem do êxito desta estratégia em um dos países mais bem sucedidos da atualidade, Singapura. E também pela trajetória pessoal deste líder nascido na Índia, com formação na London School of Economics, University of Cambridge, e na Harvard University e que ocupa posição de proeminência no governo de Singapura desde novembro de 2001.
Então dispomos de um caminho. Podemos transformar o Brasil em um país digital. E podemos juntar nossos corações e mentes para forjar uma cultura de prosperidade autossustentada, que contenha em seu DNA os valores liberais e seja protegida por um sistema imunológico contra as patologias da esquerda.
Se juntarmos a mão invisível de Adam Smith com a mão invisível da cultura social e nos darmos as mãos como cidadãos livres, digitais e de coração verde e amarelo, seremos invencíveis.
Ceska – O digitaleiro
[i] (LARAIA, Roque de Barros. Cultura. Rio de Janeiro: Jorge Zahar, 2006)